Camuflagem existencial

Todos os anos, as mulheres americanas gastam milhões (e talvez bilhões) em produtos de beleza. Este número não inclui o montante gasto em roupas, programas de dieta, associações de clube de ginástica e uma variedade de outros esforços para tornar o corpo bonito. Além disso, usar o dinheiro como uma métrica não explica a quantidade de tempo e energia (física e mental) dedicada à busca pela beleza. Muitas vezes, tais esforços são bastante dolorosos. Basta assistir a um episódio de Sex and the City ou pedir a qualquer mulher que já tenha cera brasileira. Em suma, as mulheres fazem grandes esforços para viver de acordo com padrões culturais de beleza. Mas por que?

A resposta parece óbvia, certo? As mulheres querem ficar bem. Não é necessário um doutorado em psicologia para conhecer isso. Mas por que eles querem ficar bem? Uma perspectiva evolutiva (e senso comum) fornece algumas respostas. O mercado de seleção de parceiros ao serviço da replicação genética e da sobrevivência de genes é competitivo e, portanto, é do melhor interesse de uma mulher fazer tudo o que pode parecer ser um companheiro desejável. Em outras palavras, se há muita concorrência para conquistar um homem bom, e os homens valorizam a beleza (como indicadores de treinamento reprodutivo e genes desejáveis), então a corrida armada de beleza talvez seja inevitável. Esta perspectiva certamente faz sentido, mas não parece oferecer uma imagem completa sobre o que é considerado bonito e, o que é mais importante, o que é considerado pouco atraente e despreocupado.

Pesquisa encabeçada pelo Dr. Jamie Goldenberg na Universidade do Sul da Flórida oferece uma perspectiva adicional muito interessante. Esta pesquisa sugere que os humanos são muito desconfortáveis ​​com a percepção de que eles são animais biológicos e, assim, têm grandes comprimentos para disfarçar sua criatividade. Ser um animal é um problema porque os animais fazem parte da ordem natural. Eles nascem, lutam para sobreviver e, finalmente, morrem por razões que muitas vezes não podem ser preditas ou controladas. Ser um animal que vive em um mundo natural cruel não é problemático se você desconhece essa situação (a ignorância é felicidade), mas os humanos são altamente inteligentes e, portanto, estão conscientes da realidade da existência biológica. Por outro lado, outros animais estão livres desta iluminação. Compreensivelmente, então, nós (humanos) não estamos preparados para resignar-nos ao destino de outras criaturas. Queremos ser mais que um mortal. Queremos ser especiais. Isso significa que nós fazemos grandes esforços para camuflar nossa natureza animal. Basta ver nossos rituais de grooming padrão. E pense na perspectiva de não incomodar com cortes de cabelo, barbear ou desodorante.

Então volte para as mulheres. Segundo o Dr. Goldenberg, todas as pessoas querem negar a natureza animal porque é psicologicamente ameaçadora, mas as mulheres estão especialmente motivadas a fazê-lo porque possuem características mais criativas que precisam de camuflagem. Por exemplo, as mulheres menstruam, carregam crianças e amamentam. Tais coisas nos lembram que nós como uma espécie não são tão diferentes de outros animais. Em outras palavras, é necessário um esforço extra para se divorciar do corpo feminino de sua natureza criativa. Um crescente corpo de pesquisas empíricas apoia essa perspectiva. Por exemplo, estudos antropológicos de tradições culturais históricas e contemporâneas revelam que as sociedades têm promulgado normas e regras que procuram controlar o problema da criatura feminina. Tomemos, por exemplo, as muitas civilizações que exigem que as mulheres vivam em cabanas de menstruação separadas do resto da comunidade durante seus períodos menstruais.

Experimentos de laboratório ainda apoiam esta posição. Quando as pessoas recebem estímulos que lhes relembram suas vulnerabilidades físicas (por exemplo, doença e morte) ou suas semelhanças com outros animais, eles respondem com maior desagrado e evasão de mulheres amamentando, maior aversão a mulheres grávidas e maior desagrado de mulheres que deixou cair um tampão na frente deles. Além disso, os estudos mostram que dar às pessoas motivos para acreditar que não são meramente animais (por exemplo, argumentos filosóficos ou religiosos que as pessoas são especiais e distintas) proporciona conforto psicológico e reduz a necessidade de reagir defensivamente em situações que tornam o corpo feminino aparente criativo. Em suma, as mulheres às vezes nos lembram que somos animais, e não gostamos disso.

Esta pesquisa se expandiu em várias direções interessantes e ajudou a responder questões complexas, tais como: Por que o sexo é tão altamente regulado? Por que as mulheres muitas vezes não cumprem os exames de saúde recomendados (por exemplo, mamogramas)? Por que o corpo feminino é tão frequentemente objetivado? E por que os homens agredem contra mulheres sexualmente atraentes? Esta pesquisa também inspirou estudos focados em outros temas, como preconceitos contra idosos, medo da natureza e crueldade em relação aos animais.
Em suma, uma das forças motrizes (mas não a única) por trás de exercícios de embelezamento culturalmente definidos parece ser o desejo de negar a nossa natureza animal. O antropólogo cultural Ernest Becker talvez o resumisse melhor em seu livro vencedor do Prêmio Pulitzer The Denial of Death quando escreveu:

"O homem tem uma identidade simbólica que o afasta da natureza … Ele é um criador com uma mente que se esforça para especular sobre os átomos e o infinito, que pode se colocar imaginativamente em um ponto do espaço e contemplar o seu próprio planeta. Esta imensa expansão, essa destreza, essa etereidade, essa autoconsciência dá ao homem, literalmente, o status de um deus pequeno na natureza, como os pensadores renascentistas sabiam. No entanto, ao mesmo tempo, como os sábios orientais sabiam, o homem é um verme e alimento para vermes ".

Outras leituras:

Goldenberg, JL, & Roberts, TA (2004). A besta dentro da beleza: uma perspectiva existencial sobre a objetivação e a condenação das mulheres. Em J. Greenberg, SL, Koole e T. Pyszczynski (Eds.), Manual de Psicologia Existencial Experimental (pp. 71-85). Nova York: Guilford Press.

Goldenberg, JL (2005). O corpo despojado: um relato existencial da ambivalência em relação ao corpo físico. Diretrizes atuais em Ciências psicológicas, 14, 224-228.